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Covid e o Ensino

Olá, amigos.

Espero que todos estejam bem.

Nosso país está enfrentando um platô da pandemia há alguns meses.

Isso significa que, apesar de algumas cidades estarem enfrentando seu pico de pessoas infectadas, outras já experimentam uma diminuição no número de casos da COVID-19.

É normal, portanto, que as discussões sobre a reabertura daquilo que está fechado comece a dominar as conversas.

Incluindo o retorno às aulas.

Alguns pais anseiam por este momento, mas outros tantos se sentem inseguros.

Este texto é dirigido especialmente aos pais de crianças em idade escolar.

E nosso objetivo aqui é discutir o que sabemos até agora sobre os riscos que nossas crianças estão submetidas e até mesmo preparar vocês para a possibilidade de crianças e jovens voltarem à escola neste ano.

 

Segurança

Talvez esta seja a pergunta que todos fazem: é seguro para as crianças (e professores e outros colaboradores) voltarem à escola? Infelizmente, essa não é uma pergunta fácil de ser respondida. E a resposta varia de acordo com vários fatores, alguns dos quais podem ser diferentes para cada Estado ou Município, ou até mesmo a região.

Apesar de o número de mortes entre crianças acometidas pela COVID-19 ser próximo de zero, trabalhos como este indicam que crianças menores de 18 anos são responsáveis por 7% dos casos.

Embora a COVID-19 seja geralmente uma doença leve em crianças, é importante observar que ela pode ser séria – e até fatal – em alguns casos. Alguns estudos sugerem que entre 0,6 e 9 por cento dos casos de COVID-19 em crianças resultam em hospitalização.

Parece ainda que as crianças mais novas (com menos de 10 anos) têm maior probabilidade de ter uma doença leve, ao passo que o risco de doenças graves nas crianças mais velhas é mais próximo do dos adultos. Ainda não sabemos por que isso acontece.

Finalmente, as crianças têm menos probabilidade do que os adultos de adquirir o vírus, dada a mesma quantidade de exposição.

Um estudo publicado na Nature em junho descobriu que crianças e adultos jovens com menos de 20 anos de idade tinham cerca de metade da probabilidade de adoecer após a exposição do que adultos, e estudos em outros países encontraram resultados semelhantes.

 

Transmissão


No início, os cientistas acreditavam que as crianças não transmitiam o vírus de maneira eficiente. Hoje sabemos que isso parece ser verdade em crianças abaixo dos 10 anos de idade.

No entanto, crianças com mais de 10 anos parecem espalhar o vírus em taxas semelhantes às dos adultos, mas mesmo estas ideias têm ressalvas.

Um trabalho italiano ainda não revisado (preprint) descobriu que crianças com menos de 14 anos têm menos probabilidade de serem infectadas do que adultos, mas têm quase 10% mais chances de espalhar o vírus. Além disso, um novo estudo descobriu que as crianças têm cargas virais ainda maiores do que os adultos.

Ainda não está claro o que significam estas descobertas, pois o fato destas crianças terem cargas maiores do vírus não significa necessariamente que sejam mais infecciosas. Muito mais pesquisas – e tempo – são necessárias para afirmarmos algo.

 

Transmissão

A taxa de transmissão na comunidade é um fator chave. Quando é baixa, as crianças têm muito menos probabilidade de adquirir e espalhar o vírus. E vice versa. Isso explica por que alguns países e locais conseguiram manter as escolas abertas sem grandes surtos, enquanto outros (como Israel) experimentaram surtos importantes em escolas.

Em outras palavras, a melhor maneira de garantir que as escolas possam abrir é limitar a taxa de disseminação geral na comunidade local. E o Brasil não está fazendo um bom trabalho nessa direção.

 

Medidas

O que uma escola pode fazer para limitar a propagação?

Os fatores mais importantes são distância, ventilação, máscaras e tempo.

Já podemos identificar um complicador aqui.

Precisa de um bocado de otimismo esperar que crianças pequenas se lembrem de ficar a dois metros de distância uma da outra. Principalmente nos primeiros dias, pois elas estão com saudades umas das outras, querem se abraçar e se beijar…

E se os professores vão ter de controlar isso, convenhamos, haverá muito menos tempo para instrução real.

Outras estratégias, como higienizar os calçados, mochilas, materiais, medir a febre, álcool gel sem parcimônia…tudo isso ajuda, mas não impede que o vírus seja transmitido.

Por outro lado, isso faz parte do processo educativo.

No começo a escola terá que acolher, explicar, ajudar a criança entender … se no início será difícil… com o tempo o hábito pode se consolidar.

A ventilação é um fator crucial, mas muitas escolas não estão preparadas. Mesmo não sendo uma realidade uniforme em todo o país, no inverno, as salas estão fechadas por causa do frio; no verão, por conta do calor que precisa ser controlado pelo ar condicionado. E isso é grave, pois calcula-se que o risco de contrair o vírus é 19 vezes maior em ambientes fechados do que ao ar livre.

As máscaras podem ajudar a reduzir a disseminação, mas, novamente, é difícil para crianças pequenas usá-las de forma consistente. Até mesmo a dinâmica das aulas fica prejudicada com um professor ensinando com a boca e o rosto coberto.

Em contrapartida, o número pequeno de alunos permite maior atenção… e professores são criativos. Escolas também estão providenciado máscaras transparentes

Tempo

O tempo é o fator final. O risco de contrair o vírus pode ser expresso em uma fórmula matemática simples: volume de exposição + tempo. Quanto mais tempo alguém fica exposto ao vírus, maior o risco de contraí-lo. Na escola, as crianças ficam juntas por muitas horas, então o tempo não está do nosso lado neste caso.

 

Família

 

Devemos ainda considerar as circunstâncias individuais de cada família. Alguns de nós têm filhos e também um pai, mãe, avô ou avó que mora na mesma casa. E possivelmente com alguma doença pré-existente que os colocam em maior risco de infecção grave por COVID-19.

Neste caso, é menos provável que você mande seus filhos para a escola. Por outro lado, se você precisa trabalhar, ou por qualquer motivo não pode ficar em casa com seus filhos, pode ter de mandá-los para a escola – independentemente dos riscos.

 

Dúvida

Peço perdão por não ter trazido respostas objetivas. Não há uma resposta fácil que se aplica a todos. Cada município (e possivelmente cada escola individual), e principalmente, cada família, terá de tomar sua própria decisão com base em todos os fatores mencionados acima.

 

E se a escola não voltar?

Afirmar que as aulas presenciais voltarão este ano é uma temeridade. Eu já me daria por satisfeito se elas começarem no ano que vem, mas confesso estar receoso. O que aconteceu nesta escola dos EUA explica uma parte dos meus temores. No primeiro dia após a reabertura, um aluno testou positivo. Sem teste, a epidemia se espalharia.

Sem aulas presenciais, continuamos com o ensino à distância. E todos nós, pais de crianças em idade escolar, estamos tentando descobrir se este formato está funcionando para nossos filhos. Sei que a situação de cada família é diferente, pois depende da estrutura familiar, finanças, apoio externo, condição social, acesso à tecnologia, emprego…

Sem mencionar que nossos filhos têm necessidades, pontos fortes e desafios únicos. Por isso, não existe uma solução única para todos.

Tenho certeza de que eu não sou o único pai que sente perdido nos últimos cinco meses. Estamos tentando adaptar nossas agendas pessoais no auxílio a nossos pequenos estudantes.

Diretores e professores estão preocupados em como equilibrar interesses aparentemente desequilibrados: educar nossos filhos, apoiar os pais que trabalham, garantir que todas as crianças tenham oportunidades iguais de aprendizagem, manter o bem-estar socioemocional das crianças e permitir que as escolas continuem financiadas, ao mesmo tempo em que protege a saúde e a segurança dos alunos, suas famílias, professores e funcionários.

Em todo caso, os pais precisam querer investir seu tempo na educação da criança, o momento tem exigido isso. A escola ainda é a única instituição que está totalmente preparada para que a criança continue evoluindo e aprendendo, mas emocionalmente, a escola em casa também é importante.

Complicado, né? Pois é, viver em uma pandemia global é difícil e exaustivo.

Mesmo que nossos filhos voltem para a escola, certamente eles não voltarão para a escola que conheciam antes. Portanto, que tal nos prepararmos para a realidade que vem pela frente?

O que queremos para este ano?

Não precisa fazer um plano concreto, mas de uma declaração de missão geral para sua família. Reúna sua família e discutam: o que precisa acontecer daqui para frente para vocês sentirem que este ano foi um sucesso? O que precisa ser feito para proteger a saúde mental e a felicidade das pessoas em sua casa?

Este é o momento perfeito para refletir sobre o que é mais importante quando se trata da educação de seus filhos. O que você gostaria que seus filhos aprendessem?

Para algumas famílias, gerenciar o bem-estar social e emocional de seus filhos pode ser prioridade, deixando os objetivos acadêmicos em segundo plano este ano. Talvez seja melhor seguir o fluxo e se divertir com a ideia de não ter de lidar com notas, horários ou como se vestir todos os dias.

Una-se em comunidades

Mesmo com o distanciamento social, existem maneiras de apoiarmos uns aos outros.

Você tem avôs, tias ou tios que podem dispor de uma ou duas horas por semana para ler ou ajudar no dever de casa pelo Skype, Face Time, Zoom, Meet? Que habilidades e talentos seus amigos e familiares têm para compartilhar  coisas como organizar aulas de culinária, música, arte ou ciências?

Que tal organizar algumas famílias e criar um “grupo de aprendizagem”, onde as crianças se unem para fazer trabalhos escolares, enquanto os pais dividem a carga? Ou coordenar encontros como um clube de cinema ou do livro para que seus filhos possam se socializar e diminuir a carga individual de cada família?

E é bom não esquecer de seus amigos. Com quem você vai falar quando se sentir sobrecarregado ou irritado com algo que aconteceu no seu dia a dia?

Organize-se

Anote o tempo que você pode gastar monitorando o trabalho escolar de seus filhos. Se você tem um parceiro ou parceira, decida como dividirá seu tempo. E seja honesto sobre o quanto você e seus filhos serão capazes de realizar.

Se é esperado que seu filho fique no computador das 9 às 15h e isso simplesmente não vai acontecer, entre em contato com o professor e peça adaptações. Melhor ainda, proponha uma alternativa realista para sua família. Se você estiver trabalhando em casa, verifique se há flexibilidade com seu horário. Pode haver uma maneira de começar mais cedo e fazer pausas de duas horas para o almoço, por exemplo.

Uma ideia legal é a criação de um quadro de rotinas, um local e horário fixo de realizar as tarefas escolares, até mesmo colocar o uniforme na hora da aula, isso ajuda a criança a entender.

Descubra quanto dinheiro você tem disponível para gastar na escola este ano. Muitas atividades recreativas foram canceladas. Aproveite esta diminuição de gastos para comprar um computador novo para seu filho. Existem opções mais simples, como o Chromebook que dá conta do recado.

Se você tiver mais tempo do que dinheiro, talvez seja a pessoa que pode coordenar o grupo de aprendizado ou organizar trocas de livros usados, se a biblioteca estiver fechada. Se você tiver mais dinheiro do que tempo, poderá inscrever seus filhos em aulas on-line e atividades extracurriculares

Mude seus paradigmas

Os horários diários funcionam muito bem para algumas famílias, mas não são obrigatórios para o sucesso. Da mesma forma, se você tiver espaço para configurar uma área de sala de aula designada em sua casa, ótimo. O sofá também funciona.

Qualquer que seja o sistema que funcione para sua família, tudo bem e você deve fazê-lo sem culpa. Quem se importa se seus filhos dormem até as 10 e estão fazendo aula às 19:30 debaixo da mesa da cozinha, se esse é o seu ritmo (e eles não estão dormindo nas aulas do Meet ou Zoom)?

 

Mas lembre-se do que falei sobre ter uma rotina, se for debaixo da mesa, que seja sempre lá.

Existem muitos recursos online gratuitos disponíveis para ajudar as crianças a aprender. Não precisa ficar preso ao que a escola oferece se nossos filhos precisam de mais.

Praticamente tudo o que nossos filhos fazem durante o dia – ler, assistir a vídeos, brincar de Lego, colorir, cavar no jardim – conta como aprendizado. Não sinta pressão extra para preencher cada minuto do dia escolar com atividades que parecem “trabalho”. 

Você pode priorizar. A maioria das crianças em casa, e mesmo os professores do ensino fundamental, não ensinam todas as disciplinas todos os dias. Eles praticam matemática e artes da linguagem na maioria dos dias.

Prática e repetição são importantes nesses assuntos. As “lições” podem incluir jogos de matemática, resolver problemas mentais de matemática no carro, ler para seus filhos e fazer com que eles leiam para você, assistir a vídeos de leitura no YouTube e muito mais. (Converse com os professores de seus filhos se as tarefas diárias também não forem administráveis.)

Deixe os interesses de seus filhos orientarem algumas de suas escolhas. Se eles estão lendo os romances de Percy Jackson, confira documentários sobre mitologias mundiais ou visite virtualmente museus para ver arte grega antiga.

 

Dê a si e a seus filhos muitas pausas

Quero dizer isso literal e figurativamente. Durante o dia, permita vários períodos de inatividade. Deixe as crianças se moverem entre as tarefas e fazer pausas mentais. Mesmo na escola, eles realmente não estão fazendo um trabalho focado por longos períodos, especialmente nas séries mais baixas. Não há como mantê-los longe dos eletrônicos neste período, mas incentive e crie opções de atividades lúdicas para seus filhos. Não adianta reclamar do tempo que eles passam jogando no computador ou assistindo YouTube ou Neflix se você não oferece alternativas para

Estamos vivendo uma pandemia. Todo mundo está lidando com o estresse pandêmico, mesmo que não a rotulemos como tal. Alguns dias não serão ótimos. Haverá lágrimas. As tarefas não serão concluídas no prazo. Algumas noites, o jantar será temperado com discussões sem sentido. Está tudo bem.

 

Lembre-se: isso é temporário e todos estamos fazendo o melhor que podemos

Muitos pais estão estressados ​​com os filhos ficando para trás. Talvez eu esteja sendo ingênuo, mas não estou muito preocupado com isso. Nada sobre este ano será “normal”. Tentar manter-se nos padrões dos anos escolares anteriores é irreal e injusto. Nenhum de nós precisa da pressão adicional de tentar recriar um ano escolar típico em períodos excepcionais.

Além disso, as crianças são resilientes.

Quando tudo isso acabar, e a poeira começar a baixar, será um cenário educacional totalmente novo. Todo mundo vai ter que se atualizar de uma maneira ou de outra.

 

Nem tudo é ruim

Estamos compreensivelmente preocupados com a falta de aulas presenciais, mas é inegável que o ensino à distância também tem suas vantagens. Muitas crianças estão realmente se desenvolvendo em casa. Para outros, que tinham dificuldade na escola física, as aulas virtuais foram uma mudança bem-vinda. Muitos pais, reexaminaram suas prioridades e se veem empolgados pela possibilidade de acompanhar o processo de aprendizagem de seus filhos.

Desde o início da pandemia defini objetivos: sair dela vivo e saudável.

E que o mesmo aconteça com minha família e meus amigos.

Até aqui sou grato por isso.

Quero escrever um texto ao final deste período e desejo fervorosamente que você possa lê-lo.

Aguentem firme, amigos.

Carlos Braghini Jr.

Um comentário sobre “Covid e o Ensino

  1. Um texto realmente esclarecedor, Dr. Braghini. É preciso explorar novas formas de aprendizagem. Mais um pouco de tempo e tudo isso vai fazer parte do passado. As inovações surgiram e vão continuar acontecendo e sendo aperfeiçoadas.
    Grande abraço!
    Sonia Salim

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